por Barbara Heliodora
É sempre difícil falar sobre Maria Clara; a ausência de sua figura irrequieta, eternamente criativa, transbordante de amor e curiosidade pelo teatro e o que este podia fazer para explorar, informar, enriquecer e divertir o universo infantil ao qual dedicou seu talento, é um empobrecimento constante para todos nós. Do mesmo modo que, inevitavelmente, pensar em Maria Clara ou entrar mais uma vez em contato com sua obra traz uma grande alegria, o momento vem sempre acompanhado de uma dor, que nos deixa conscientes do vazio que sua morte nos trouxe.
Por causa de Maria Clara, de sua disciplina e liderança que provocavam tantas piadas a respeito de seu espírito de Bandeirante, compartilhado com o querido núcleo inicial que com ela nunca deixou de trabalhar, havia realmente uma atmosfera muito especial no universo do Tablado: trabalho compartilhado, boa vontade, alegria, e uma confiança absoluta de que, não importa qual fosse o problema, Maria Clara encontraria uma solução. Por causa desse clima é que o Tablado nutriu tantos talentos, em várias áreas das artes cênicas, pois no mundo de Maria Clara todos os aspectos do teatro tinham igual importância, e o trabalho de todos era igualmente apreciado, respeitado, estimulado.
De muito poucos, na história do teatro brasileiro, poderá ser dito, como se pode a respeito de Maria Clara, que sua contribuição individual trouxe mudanças radicais e fez o teatro caminhar. Passam-se os anos, e já serão raros aqueles que, como eu, têm idéia do que era o teatro infantil no Brasil antes de Maria Clara; via de regra, o princípio determinante era o de que para o público infantil qualquer coisa servia, desde que se fizesse a platéia gritar e ter o riso fácil da bobagem.
Quando a cortina abriu e Pluft perguntou “Mãe, gente existe?”, para iniciar um espetáculo da mais alta qualidade cênica, que contava uma história inteligente e divertida, com um elenco muito bem ensaiado, o teatro infantil do Brasil mudou; o sucesso de “Pluft” foi tamanho, o boca a boca tão fenomenal, que os realizadores do “qualquer coisa serve” foram forçados a procurar melhoras, pois estavam, claramente, perdendo seu público, enquanto aumentavam as filas para os espetáculos do Tablado.
Ter privado com Maria Clara, mesmo que menos do que gostaria ter sido possível, foi um dos momentos privilegiados da minha vida, tanto pelo que era quanto pelo que ela fez.
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