Projeto concebido originalmente para a área de Ideias do Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) Brasília, Mitos do Teatro Brasileiro é calcado na memória das artes cênicas nacionais.

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Autran sorri


Mariana Moreira

Publicação: 23/09/2011 08:58 Atualização:

Cenas dos atores Silvana de Faveri e J. Abreu intercalaram depoimentos  (Edilson Rodrigues/CB/D.A Press )
Cenas dos atores Silvana de Faveri e J. Abreu intercalaram depoimentos


Karin Rodrigues arrancou gargalhadas da plateia com as histórias contadas: graça aprendida com o marido (Edílson Rodrigues/CB/D.A Press )
Karin Rodrigues arrancou gargalhadas da plateia com as histórias contadas: graça aprendida com o marido
O termo homenagem pode soar melancólico e tendente ao saudosismo. Mas a atriz Karin Rodrigues e o ator e diretor Elias Andreato fugiram da obviedade e imprimiram um tom leve ao tributo que o projeto Mitos do Teatro Brasileiro fez, na última quarta-feira, ao ator Paulo Autran. Ao falar dele, a dupla manteve sintonia no humor e na emoção, exaltando em uníssono características que toda a classe artística atribui ao senhor dos palcos: a grandeza cênica, a humildade nos relacionamentos e a entrega incondicional ao teatro. A noite ainda teve cenas que revelaram a intimidade e a trajetória do homenageado, interpretadas por J. Abreu e (a surpreendente) Silvana de Faveri no tablado.

As participações de Autran, em cenas e entrevistas exibidas no telão, foram um indício do clima cômico da noite. Sua sinergia com Tônia Carrero durante um especial da peça Um Deus dormiu lá em casa, exibido pela televisão nos anos 1980, divertiu o público. Em outra passagem bem-humorada, protagonizada pelo ator, ele contou a respeito de sua primeira peça. O texto, retirado de uma revista infantil, chamada Tico Tico, originalmente se chamava O tio da roça. Paulo demonstrou intimidade com o tema ao fazer sua primeira adaptação — o tio virou tia, para que a mãe do vizinho pudesse interpretá-lo. Em sua primeira produção, ele cobrou ingresso da vizinhança, com valores diferenciados para adultos e crianças.

Karin começou o depoimento com voz embargada. “Esta é a primeira vez que venho a Brasília sem o Paulo”, contou a viúva do ator. Em seguida, assumiu sua porção espevitada e arrancou gargalhadas da plateia. Para mudar um pouco o discurso de exaltação, a atriz elencou defeitos do marido. “Ele não gostava de perder no jogo, fumava muito, dirigia mal, queria as janelas sempre fechadas e não deixava os cachorros subirem no sofá”, enumerou. Pequenas intimidades ganharam tom jocoso: “Ele nunca engordou. Manteve o peso e as mesmas roupas de solteiro”, brincou.

Cinzas no jardimNem ao falar da morte Karin deixou a graça de lado, habilidade que diz ter aprendido com Autran. “Ele parou de fumar por um ano e meio e fez cinco pontes de safena. Ele era sempre o máximo”, destacou. Um dos episódios que mais despertaram risadas foi o relato sobre a cremação do ator. Ao receber seus restos mortais, a atriz teve a ideia de atirá-las no jardim. “É gostoso pensar que ele está no meio das flores”, afirmou. Amigo e parceiro profissional de longa data, Andreato emendou: “O Paulo detestava ir para o jardim. Queria ficar fumando dentro de casa. Enquanto a Karin jogava as cinzas, ela dizia: ‘Agora você vai para o jardim’”. Ao ser perguntada se Paulo gostaria de morrer no palco, a atriz cravou: “Todo ator gostaria de morrer no palco, assim como todo nadador gostaria de morrer na piscina”.

Andreato sustentou o bom humor de Karin e também leu um poema, inspirado na amizade que manteve com Autran e a mulher: “Amigo que não ri junto não sabe chorar junto”. A risada foi uma das lições que o amigo deixou. “Nos últimos seis anos em que convivi com eles, a vida foi mais leve, mais alegre. A gente deu muita risada, até o último momento”, relata. Sentado na plateia, Sergio Mamberti foi convidado a se juntar a eles no palco. “Vi Paulo e Tônia em Um deus dormiu lá em casa. Ele foi meu modelo de ator”, afirmou Mamberti.

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