Projeto concebido originalmente para a área de Ideias do Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB) Brasília, Mitos do Teatro Brasileiro é calcado na memória das artes cênicas nacionais.

sexta-feira, 4 de maio de 2012

A delícia de ser Clarice/Beth




Uma das montagens teatrais mais aclamadas dos últimos tempos volta à cidade onde estreou nacionalmente   

Sérgio Maggio

A relação de Clarice Lispector com Brasília foi intensa, profunda, visceral e devastadora. Os sentimentos assombrados diante da cidade erguida no centro de Goiás foram plasmados em belíssimo jorro de palavras. Os fragmentos que escorrem nesta página mostram o quanto a mulher sensível era instigada por aquela paisagem inexplicável aos seus olhos. O choque entre o ser humano e o monumental provocou reflexões únicas sobre a novíssima capital brasileira.
A relação de Beth Goulart com Brasília se transformou bruscamente desde que estreou nacionalmente aqui o espetáculo Simplesmente eu, Clarice Lispector, em 9 julho de 2009, no palco do Centro Cultural Banco do Brasil (CCBB). Na montagem, a atriz se desnuda completamente para dar vazão à imagem lúdica, poética, feminina e potente daquela que é considerada um dos mitos da literatura nacional. “Me senti abraçada pela cidade e pelo público que respirava junto comigo em cada passagem da personagem, em cada reflexão, em cada silêncio. A cada sessão, podíamos quase que segurar nas mãos a densidade do silêncio, era uma meditação coletiva e muito poderosa. Uma experiência inesquecível para mim”, lembra a intérprete.
Depois que saiu daqui em temporada nacional, com sessão extra e uma fila enorme de órfãos que não viram ou queriam repetir a experiência de ficar diante daquela montagem, Beth Goulart viu se concretizar o sucesso esboçado já na estreia, quando a peça nascia sem a urgência dos ajustes. Hoje (05/05), Simplesmente eu, Clarice Lispector reencontra a plateia original numa função dupla, às 21h, e às 23h (a primeira está lotada), no Teatro Oi Brasília. “Com o tempo, o espetáculo ficou mais orgânico e a sua fluidez seguiu com delicadeza as emoções das personagens. A intimidade com Clarice é mais real. É como um vinho que o tempo aprimora.”
Um das atrizes mais representativas de sua geração, Beth Goulart viu o espectador se aproximar mais intimamente do trabalho de Clarice. E foram gloriosos 200 mil até agora em 22 cidades do Brasil. Alguns revelaram que buscaram a literatura imediatamente após sair do teatro. Beth se emocionou ao ouvir tais declarações. “Muitos nunca tinham lido nada dela porque não compreendiam, ou simplesmente pela estranheza de sua literatura. O espetáculo de certa forma criou uma ponte entre a escritora e a mulher. Ela foi entendida por meio da sensibilidade e do reconhecimento, que ela sempre buscou.”
É impressionante ver Beth Goulart em cena como uma Clarice Lispector tão delicadamente exposta. A verossimilhança com a personagem, que chamou bastante a atenção dos espectadores, não assustou a atriz. Na verdade, ela, que escreveu e dirigiu a montagem, seguiu a orientação do mestre Amir Haddad (supervisor do projeto) de parecer por dentro e não por fora de Clarice. “Revelar não a solidão de Clarice mas a minha, não a sua angústia, mas a minha. Nesse sentido, eu me revelei no espetáculo tanto quanto ela.”

SIMPLESMENTE EU, CLARICE LISPECTOR
Direção, texto e atuação de Beth Goulart. Supervisão: Amir Haddad. Hoje 05/05, às 21h (esgotado), e, às 23h, no Teatro Oi Brasília. Ingressos: R$ 60 e R$ 30 (meia). Não recomendado para menores de 12 anos.  

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